segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

O DIA DO SENHOR




  Os seis soldados saíram do rancho após o jantar, por volta das 17:45 hrs, depois de jogaram a sobra de suas bandejas no latão de lixo, que sempre estava imundo, sentaram-se nos degraus e ficaram esperando o sargento de dia, que os conduziria de volta à Companhia.

- Pelotão em forma em coluna de três – Disse o Sargento ao chegar.

Os soldados se levantaram e ficaram em forma, em duas colunas de três.

- Sentido.
- Em direção à Companhia, marche.

O pelotão, formado pelos soldados que estavam de serviço na Companhia naquele sábado, nos plantões de alojamento, banheiro e garagem, seguiu rumo a Companhia, onde outros três soldados que estavam na hora seriam substituídos às 18 horas.

O pelotão seguiu pelos fundos do quartel, passou pelo cassino dos sargentos e depois por uma parte quase desativada do quartel, mas à frente ficava a guarda 2 e a cadeia. Ao passar pela cadeia o último soldado da coluna da direita falou bem baixo ao soldado da coluna da esquerda.

- Tem um cara preso ai, dizem que há anos, nem recebe visita, ninguém sabe o que fez.

- Deve ser comunista – Disse o último soldado da esquerda.

- Na semana passada eu estava de guarda na área de instrução, perto do primeiro paiol, fiquei olhando o salto noturno dos paraquedistas e vi quando um desceu direto, o paraquedas não abriu, ouvi o grito do soldado que ecoou no céu, era o grito da morte, acho que nunca mais esquecerei aquele grito.

- Pelotão, alto – Ordenou o Sargento.

O pelotão parou imediatamente.

- Descansar – Ordenou novamente o Sargento.

Os soldados ficaram em posição de descanso,  obedecendo os comando como se fossem animais adestrados.

- Quero silêncio durante o trajeto, nada de conversas – Disse o Sargento.
- Sim Senhor, Sargento – Responderam todos.
- Pelotão, sentido.
- Em direção à Companhia, marche.

O pelotão seguiu em silêncio até Companhia, entrou no pátio e em frente a entrada do alojamento o Sargento ordenou:

- Alto.
- Descansar.
- Ao meu comando, fora de forma e lavar as bandejas.

Antes de o Sargento ordenar o último soldado da coluna da direita levantou a mão.

- Fale soldado.
- Sargento eu posso fazer uma pergunta?
- Pode.
- O que fazemos aqui?
- Como assim?
- Por que estamos aqui?
- Temos o dever de defender a Pátria soldado.
- Eu não vejo nada de útil no que ensinam aqui, no que estou aprendendo.
- E o que você aprende aqui?
- A matar meus semelhantes.
- Errado soldado, você aprende a defender a Pátria dos seus inimigos.
- Não Sargento, eu não tenho inimigos, sendo assim, vocês me ensinam a matar semelhantes, nada mais.
- Número soldado.
- 735, Senhor.
- Pelotão, fora de forma – Ordenou o Sargento e prosseguiu:

- Você não 735, você fica.

Arnoldo Pimentel

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

THE END



O por do sol é logo ali
Depois do campo
Todos os meus discos estão trancados
Até o Jim Morrison
E o James
A Discovery desapareceu no céu ainda há pouco
Não existe farol
Não existe mar

Arnoldo Pimentel

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Minha sensibilidade
foi embora
fugindo pela janela
como uma borboleta
saindo do casulo...

A caneta agora
produz rabiscos toscos
conforto-me a pensar
que a brisa primaveril
que acaricia meu corpo
me leve a encontrar
minha sanidade que fugiu
pela janela.

                   Jorge  Medeiros
                     (14\11\2013)

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

"FAROL DE SÃO TOMÉ" OU "É PRECISO PARAR DE CHORAR"




FAROL DE SÃO TOMÉ OU É PRECISO PARAR DE CHORAR
Dedicado aos amigos Fabiano Soares da Silva e Rosilene Ramos
Obs: “Farol de São Tomé” é título de um poema Do Fabiano
“É preciso parar de chorar” é um verso do poema
“Adorno” da Rosilene


FAROL DE SÃO TOMÉ OU É PRECISO PARAR DE CHORAR
Passam das dez horas
E o toque de silêncio
Avisa que é hora de apagar as luzes

Minha luta contra o regime opressor é eterna
Assim como minha busca em compreender Deus

Quase todas as camas estão vazias
E forradas com lençóis brancos
Vou deitar-me numa lá no canto
E ouvir o rádio baixinho para tentar dormir

Muitas músicas são proibidas
Aqui, quase tudo é proibido,
Por isso, ouço o rádio no volume mínimo,
Para que os guardas não possam ouvir
E vir com seus paus de barraca

A carceragem fica junto ao muro dos fundos
E sempre cabe mais um
Eu já estive naquelas celas, sei muito bem com o é

Eu tenho um livro de poesias
De uma poetisa amiga minha
Em um de seus versos ela diz
“Que é preciso parar de chorar”

Todas as noites aqui são escuras
E os dias não existem
Este lugar está cheio de fantasmas
Em noites de tempestade eles são visíveis
Eu sei, sempre os vejo.

Arnoldo Pimentel

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

MONÓLOGO (Trilogia dos Lobos Parte III)




MONÓLOGO
TRILOGIA DOS LOBOS PARTE III
                                              
Eu acredito em Deus
Eu não acredito em Deus
Eu acredito em Deus
Eu não sei mais em que acreditar
Eu acredito em Deus

Ontem o padre falou sobre o amor ao próximo
Falou sobre Jesus e sobre o que Ele ensinou
Acho que Jesus nunca vai conseguir
Colocar amor no coração do homem
Por mais que Ele queira

Todas as manhãs eu tinha que rezar
E tomar café
Só depois eu podia ir brincar no quintal
Eu brincava, corria, até cansar
Depois eu ia até a cerca de madeira

A cerca era pintada de branco
Eu me encostava e ficava olhando lá longe
Os prédios das cidades

Eu queria muito ir às cidades
Eu acreditava que nas cidades eu poderia ser...
Ser alguém de verdade
Eu acreditava nas cidades

Mas não podia atravessar a cerca de madeira
Ali dentro eu tinha o quintal
Eu tinha as bênçãos, as razões, as ordens, os medos

O livro virou decoração
As casas estão vazias
As igrejas estão vazias
O olhar olha de um outro jeito
Eu queria muito ir às cidades