sexta-feira, 29 de abril de 2011

MONÓLOGO DA TUBERCULOSE VAGINAL



       Eu pensei que tivesse um tesouro, mas vi que o tesouro era o simples orvalho que evaporava com o luar. Eu sei que já havia tempos que estava angustiada com sua presença ausente, com sua indiferença aparente, seu jeito distante de ouvir o violão silencioso do nosso filme falado colorido em preto e branco. Naquela noite tudo já estava consumado, faltava apenas o ultimo ato, não ensaiado, há muito pensado, para eu saber que não precisava de você ao meu lado, que não precisava ficar olhando seu corpo adormecido ignorando meus anseios, meu desejo de te ter, de fazer com amor durante as madrugadas frias ou quentes sobre nossa cama, sempre deserta, povoada apenas pela minha azia, tendo somente o cobertor barato comprado na promoção de final da feira livre, servindo de metáfora para aquecer-me e extasiar-me do prazer isolado do não ter.  Naquela noite passeei pelo quarto, fui até a janela, abri a cortina e deixei a noite clarear minha camisola azul piscina opaca, depois encostei-me na parede,  junto a porta, deslize-me silenciosamente até sentar-me no chão, estiquei as pernas,  deixei as alças da camisola caírem e meus seios ficaram desnudos, comecei apalpar-me e senti o amor que tenho por mim, com meu corpo banhado pela tênue luz da lua que entrava pela janela com as cortina aberta.

sábado, 23 de abril de 2011

Poema Desconcertado




Quisera Deus que eu escrevesse estas palavras para me expressar
Mas, na verdade, escrevo para me desabafar.
Como um fantasma obsessor
Tu ressurges do nada para me confundir
como uma dor que se finge de orgasmo só para me iludir.
Eu pisava em nuvens com o asfalto protegendo a minha cabeça
Quando aparecestes conduzindo meus olhos.
Tu eras tão exuberante quanto uma aquarela
e eu me via tão comum quanto uma telenovela
quando eu gostei do teu jeito de andar
do teu jeito de não me notar.
Eu era um peixe falastrão passeando por praias mudas.
Na ânsia de ter o que se quer
todo homem é meio Jesus e meio Judas.
Desse vinho queria eu beber até a última dose
e era em ti que eu refletia toda a minha neurose.
Questionando os vaidosos que arrogantemente somos
não sei se ainda guardas as marcas de meus dentes em teus ombros.
Nesse romance mal interpretado de personagens mal explorados
Tu permitias que eu me perdesse entre frases feitas,
pessoas mal resolvidas,
pensamentos bobos,
coisas mal ditas.
E eu só queria,
pelo menos uma vez na vida,
que os nossos corpos
fizessem parte dos vários pares de corpos que rolam na noite
Mesmo com toda dor que isso pudesse causar,
Mesmo com toda camisinha que disso pudesse cuidar.
Caindo na boca de toda essa gente.
Ao mesmo tempo igual
ao mesmo tempo tão diferente.
Pois teu jeito entrou na minha cabeça
como um espermatozóide enlouquecido
penetrando o óvulo umedecido
que fecundado gerou um abismo
onde eu insisto em afundar.
Caindo na boca de todo esse pessoal.
Ao mesmo tempo tão diferente
e ao mesmo tempo tão igual.
Na simples aventura de amar,
sinto que meu sentimento vale ouro.
Acredito que fomos feitos para nos encontrar,
mas não feitos um para o outro.
Um sentimento que pareça bastante verdadeiro
não quer dizer que seja totalmente sincero.
Um pensamento que se apresente muito mentiroso
não quer dizer que seja absolutamente hipócrita.
Hoje,
por não ter resistido ao fascínio,
grito a minha histeria,
me condenando ao ócio eterno
e entregando minha carne a pernilongos.
Na verdade, não te culpo por não ter me achado.
Sua grande crueldade foi não ter me amado.

Marcio Rufino
Todos os direitos reservados.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

ARPOADOR (Gambiarra Profana, o coração que pulsa minha poesia)



Meus dias são iguais aos seus
Sem o brilho das gaivotas
Que brincam de caçar peixes
Enquanto voam em volta do mar

Parece até que ficamos
Apenas sentados na varanda
Esperando o dia cair
Entre as folhagens que a noite vai cobrir

Sei que os dias passam
E os anos ainda vagam
Pelo tempo

Sei que apenas nos olhamos
Cada um em sua varanda
Com os rostos tocados pelo lamento do vento

segunda-feira, 18 de abril de 2011

O morro, a igreja e as crianças




Era como se fosse uma miragem
Era como se fosse além da paisagem
O enorme morro verdejante
Que ficava na frente da igreja delirante
Crianças produziam cambalhotas
Em desesperadas e dionisíacas galhofas.

O sol escondia a cara atrás da nuvem preta.
Depois a mostrava por baixo da nuvem fazendo careta.
Era como num filme de faroeste.
A gente chegava numa romaria
Numa viva imagem de tela campestre
Quando começava a adoecer o dia.

Os meninos ansiosos sufocavam o grilo
Na mesma mão que perseguia a borboleta.
Os olhos avistavam a enorme cruz
Que abrigava o pombo negro
Que descansava impávido em cima da igreja.

Mas as cambalhotas, as gritarias, as correrias,
O futebol, as bagunças
Não se podia pisar no capim escandalosamente verde
Apesar de a grama querer ser amada pelos pés nus das crianças
E uma menina comia assaí como se fosse sorvete.

O urubu dançava no ar seu vôo solo
Profetizando, encenando e anunciando intensa chuva
Algo em minha natureza pedia colo.
Outra menina andava pra traz por todo o quarteirão da rua.

O urubu
O ourobú
O ouro burro que nascia das palavras do garoto
Que insistia em pular com um só pé
Depois lançava escandalosos arrotos
Por cima da oferenda de candomblé
A oferenda servida no chão da esquina
O banquete exposto no chão da encruzilhada
É a revelação da multiplicidade divina
De que Deus não diversifica só as massas.

O sonho se estabelece no agora
De um instante que brincava com seu centro
A menina me pede pra brincar lá fora
E eu digo à ela que lá fora é aqui dentro.

Marcio Rufino
Todos os direitos reservados

sábado, 16 de abril de 2011

O Festival de Abóboras




Este vídeo é o primeiro de uma série intitulada a “Hora do Riso” do multimídia Eric de Deus (roteirista, câmera, diretor de elenco, contra regra, figurinista, cenógrafo, diretor geral, produtor e etc.).
Filmado em Belford Roxo/RJ por uma câmera amadora de Mini VHS “O Festival de Abóboras” é lirismo aos extremos revelando uma obra repleta de fúria.


CHEIRO DAS ÁGUAS

Diante deste mar, ao cheiro destas águas
Que nos separam, vertem palavras como numa nascente e,
Docemente as recebe e as devolve,
Faz-me pensar que vives assim, tão só como eu...
Eu voaria sobre estas águas por um fio de esperança que
Abrandasse o desassossego da minha mente...
Para que eu mesma entendesse,
O desfolhar desta árvore na trilha
Que se segue a minha frente...

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Você não conhece todos os meus versos




Você ainda não conhece os versos
que nascem na calada da madrugada fria
embaixo do cobertor.

Você não conhece os versos que nascem
quando sozinho, preocupado e sem graça
ando pelas ruas insossas de Belford Roxo
e vejo suas paredes descascadas,
seus comércios decadentes,
os adolescentes indo para a escola em bandos histéricos,
os homens nus da cintura para cima bebendo cerveja,
as mulheres carregando sacolas de supermercado,
as crianças brincando,
os muros pixados,
os terraços das casas perdidos entre as abóbadas das árvores,
o asfalto sujo e corroído de excremento de cavalo.

Você não conhece os versos que nascem
quando ao ouvir canções de amor
me derreto como o sorvete
que se derrete ao calor da língua,
pois somente nos meus versos
posso, quero e devo fazer amor,
não só com mulheres e homens,
mas também com crianças, bichos,
plantas, coisas, anjos, santos
e Deus muito além das orações.

Você não sabe que meus versos
querendo conquistar além de amizades
acabam saqueando corações e almas
e não conseguem saquear corpos.
É mais louvável, belo e heróico
saquear corações e almas,
mas meus versos, mesmo assim,
sentem inveja do versos que saqueiam corpos.

Eles também desejam as efemeridades,
as futilidades, as inutilidades, os escárnios,
as zombarias, os abusos, os excessos,
as orgias, as luxurias, o prazer.

Meus versos piratas
não querem o ouro,
não querem a prata,
não querem o euro,
nem o dólar.

Eles querem a bobeira, a palhaçada,
a maluquice, a brincadeira.

Portanto,
não me venha com seu falso equilíbrio,
seu cuidado, seu bom senso, seu "você há de convir",
seu "não é bem assim", seu "você tem certeza?",
seu "pense melhor", seu "você pode se arrepender".

Seu tudo aquilo que é a gaiola do mundo,
o cadeado do sonho,
a grade da vida
que quer encarceirar o céu
que pare a pomba branca da paz,
a terra que pare o lôdo,
o espelho que mostra a minha cara
parindo minha barba e meu bigode,
o sentimento que pare o gesto,
o pensamento que pare a palavra,
a natureza que pare a paixão.

É...
Você não conhece todos os meus versos.

Marcio Rufino
Todos os direitos reservaods.

quarta-feira, 13 de abril de 2011






A leveza
de minha existência
se encontra
no peso de um
corpo suado
sobre o meu...

Jorge Medeiros

sábado, 9 de abril de 2011

ORGASMO

                                       
                      
Sentiu todo orgasmo
Da solidão
Quando abriu
O pequeno portão
E viu as luzes da casa
Apagadas
Sentiu-se tão sozinha
Que nem mesmo olhou pro lado
Abriu a porta
E foi direto pro seu quarto
Despiu-se
Deitou-se 
Ficou olhando pelas poucas
Telhas de vidro
Entregando-se nua
Pra lua
                                   

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Identidade




Se alguém perguntar
Quem eu sou
Diga que sou uma criatura quase humana
Algo entre religioso e monstruoso
Um simples moço.

Se alguém perguntar
Em que dia nasci
Diga que foi num dia
Em que Deus, muito estressado,
Com tanta coisa lhe enchendo o saco
Fez com que minha mãe
Bota-se pra fora
Algo que não fosse nem pergunta e nem resposta
Uma complicada incógnita.

Se alguém perguntar
Qual é a minha cor
Diga que é a do mundo inteiro.
Pintada por festas, sofrimentos de amor,
Muitas revelações e alguns segredos.

Se alguém perguntar
Qual é a minha
Curto carne, frango e sardinha
Ou qualquer outra coisa que esteja na panela.
Curto também pessoas
Muito além do que elas têm entre as pernas.

Se alguém perguntar
Onde moro
Diga que por aí
Chegando de repente
Sem hora pra partir.

Marcio Rufino
Todos os direitos reservados
Crédito de imagem: site Baixaki.

sábado, 2 de abril de 2011

COTURNO COR-DE-ROSA



COTURNO COR-DE-ROSA

Na capa do Batman
N’uma situação cachorra
Na mesma situação que a de Jesus na cruz
Jesus Afrânio da Silva o servente da cruz vermelha
Vermelha como a calcinha do Príncipe Charles
Que tinha uma vaca preta
Preta quase azul
Azul como o batom que reluz na boca de Marcelo.

Mas o que todos desejam é sair pelas ruas
Vendo um tráfego de percevejos com elefantes na contramão
E a sua sedutora fada-bruxa banhada em óleo de oliva
Sob luzes fluorescentes
Fluorescentes multicoloridas
Multicoloridas quase azul
Azul como o batom que reluz na boca de Marcelo.


(Sergio-SalleS-oigerS)


Esta é foto é da época em que eu escrevi o "Coturno Cor-de-rosa".


O olhar de uma mulher





Uma mulher quando olha para um homem
É um convite.
Pobre de quem pensa
Que é um convite só para o sexo.
Na verdade é um convite para outro universo;
Infeliz de quem acha
Que é um convite só para o namoro.
É um convite para outro mundo
De possibilidades de recomeços
Mesmo que não haja assuntos.
Mesmo que não haja beijos.

É um olhar incerto
Que revela o fluxo de energia
Que nosso coração de anjo e bruxo
Desenvolto em euforia amoral
Consome e estende a cada dia
E deixa fluir para o astral.

Marcio Rufino
Todos os direitos reservados
Crédito de imagem: site Baixaki

TRILOGIA DO DIA NUBLADO


 DIA NUBLADO

Às vezes parece até noite
Mas são os olhos que lembram
Que ainda não te ouvi
E o dia fica assim
Tipo nublado
Quase calado
Esperando a tarde cair


 VENTO COM NUVENS
A cena da moto é inspirada na liberdade poética do meu amigo e parceiro Sérgio Salles-Oigers 

Parece até que vi a praia
Que ouvi gaivotas
A minha volta
Quase senti suas palavras
Tocarem meu rosto
Olhei pro céu
E não vi o sol
Subi em minha moto
E segui sem destino
Sem sentir o vento
Nos óculos escuros
Apenas segui por ai
Sem pensar em nada
Na tarde nublada


CORES DO OUTONO

Com as folhas de outono
Enfeitando o chão
Dá pra sentir
As gotas da chuva fina
Beijarem as folhas
Minhas pegadas se misturam
Com o tom amarelo
Ainda espero o céu se abrir
Para tentar ver entre as árvores
As sobras de nuvens
Que pintam o ambiente
E depois apenas seguir
Enquanto as folhas com som amarelo
Possam secar
Depois que a chuva passar